sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Fui visitar os fantasmas e eles não queriam mais reclamar.


Eram 23h37min. Não estava frio, mas de tempos em tempos passava uma brisa que penetrava na minha alma. Eu poderia estar dormindo, é sábado, mas ao invés disso eu estou preso neste cemitério. Um lugar que me incomoda, para impressionar uma garota que não me agrada, pela insistência de amigos que eu desgosto.
Estávamos vagando pelos arredores da cidade havia umas duas horas. Tudo era pra ser apenas mais uma noite em que esses adolescentes de mente mal desenvolvida iriam danificar alguns bens públicos, beber até não sentir o próprio rosto e achar que tem o universo todo aos seus pés. Se não fosse por um deles ter dado a incrível ideia de visitar um cemitério no meio da noite. Obrigado a dois adolescentes despreocupados nos anos 90 por trazerem este exímio exemplar de ser humano à vida.
Fico tentando imaginar algo que tenha um tamanho proporcional a sua mediocridade. Bill murmura alguma piada de duplo sentido pra mim e faz com que todos comecem a rir. Por que você não explode Bill? Por que você não simplesmente desaparece com o poder da minha mente? Eu poderia gritar isso na cara dele, eu poderia avançar em todos que seus lentos reflexos não me alcançariam. Poderia até sair correndo pra casa e provavelmente ser sequestrado, mas ao invés disso, eu simplesmente dou uma risada leve, não curta, leve.
São 23h29min. Meu relógio só pode estar de brincadeira comigo. Tasha começa a vomitar perto de um portão. É-me indiferente. Ela sempre é a primeira, mas devo admitir que desta vez seu ápice foi alcançado com mais rapidez que as outras vezes. Todos ficam rindo enquanto ela bota pra fora toda a angústia que secretamente eles carregam. Angústia, ou simplesmente sua última refeição. Difícil saber.  Que nome horrível.
Alguns minutos passam, menos do que eu gostaria, até que chegamos à parte com as sepulturas interessantes. Estátuas de figuras que alternavam entre anjos e demônios. Minha sincera opinião: É um cemitério legal, é daqueles que você vê nos filmes, a diferença é que as estátuas não estavam em uma grande batalha ou nos arrastando para o inferno.
Eu sabia que a noite iria acabar e que eu poderia ir para casa, só que mesmo assim a angústia de estar naquela situação superava qualquer certeza. Sentamos no chão formando um circulo onde todos, sob efeito do álcool, começaram a falar suas descobertas redundantes. Aquela cena era tão ridícula que me eu sentia um câncer crescendo dentro de mim. Alastrando-se pelo pouco bom senso que me restava. Afinal de contas, eu estava ali, não estava?
E ali estávamos todos sentados, eles jogando aquelas palavras desenfreadas pra fora, eu ouvindo até imaginar meus ouvidos sangrando, quando Jeanne (a garota gótica e magricela que tentaram jogar para cima de mim porque ela tem algum desejo incansável de atirar-se em garotos aparentemente “quietos”) começou a rir, mas eu digo rir mesmo. Passou a rir tanto que eu não aguentava mais e minha cabeça ia fazer-se em pedaços. Uma risada tão bizarra que até o subconsciente dos outros os fez acordar, mesmo que por uns segundos para tentar entender o que estava acontecendo. Ela continuou rindo e rindo, até soluçar e voltar a rir. Rir tanto que o ar não tinha mais tempo nem espaço de entrar em seus pulmões. Ela riu até não poder rir mais, nem nada mais. Ela agora estava estirada no chão com aquele sorriso diabolicamente perturbador enquanto todos a encaravam, eu esperava que ela fosse acordar e voltar a rir... Esperei e fui decepcionado. Minha respiração começou a ficar ofegante, Lina e Tasha começaram a gritar e chorar, Todd estava muito além da consciência pra entender a situação, Bill começou a gritar com as gurias. Por uma fração de segundo, eu senti uma espécie de medo que não conhecia. Ficamos todos de pé e perguntas óbvias, gritos e ideias foram sendo expelidas por cada um. Tudo tinha uma redundância tão grande que a raiva que eu sentia com aquelas pessoas só foi voltando. Checam o pulso inexistente de Jeanne enquanto eu tento não olhar para aquele sorriso, aquele sorriso que começava a ser esculpido na minha mente e eu provavelmente nunca iria esquecer. As garotas continuavam a chorar até que Todd, que parecia haver chegado à situação deu a ideia de que a enterrássemos. Era um cemitério, ninguém iria procurar lá, é só mais uma sepultura no meio de milhares. Havia pás e bastante espaço. Bastaria negar qualquer relação que tivéssemos com o desaparecimento daquela garota que não iria fazer muita falta no mundo, bem talvez seus pais, mas muitos pais são obrigados a passar por isso. Poderíamos simplesmente entregar seu corpo, receber toda a culpa, e com uma grande probabilidade sermos os notáveis responsáveis pela morte dessa garota que tinha tantos problemas quanto o planeta em si. Alguns minutos se passavam, mas eu não sentia. As gurias soluçavam vomitavam, Bill chorava como se fosse uma delas, Todd... Todd estava sem expressão e cavava a cova. Jeanne mantinha seu sorriso, aquele que eu não consigo esquecer. Não pense que eu tomava a situação com tranquilidade ou tanta indiferença, talvez eu simplesmente não entendesse a gravidade do que aquele grupo infeliz estava fazendo e eu estava testemunhando esse tempo todo. Talvez a imagem não estivesse clara por completo. Eram 00h45min e eu vi. Eu entendi e eu só fiquei calado.

                                                                                        -Nick

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